O que é realmente necessário para acabar com a escravidão moderna
1 Fevereiro 2017
Aprovado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 2014, o Protocolo entra em vigor em 9 de novembro de 2016. Rosinda Silva e Aurélie Hauchère Vuong, da Organização Internacional do Trabalho, explicam porque essa data é importante.
Ilustraçoes por Gill Button

Rosinda Silva and Aurélie Hauchère Vuong, ILO
O que significa exatamente “entrada em vigor”?
A entrada em vigor é muito importante porque marca a data a partir da qual as obrigações de um texto legal começam a ser eficazes para os Estados que a aceitaram formalmente, ou seja, que a ratificaram. Cada país que ratificou o Protocolo tem agora que informar sobre o cumprimento dos compromissos resultantes. O texto do Protocolo prevê a sua entrada em vigor um ano após a sua segunda ratificação, ou seja, em 9 de novembro de 2016, um ano após a sua ratificação pela Noruega, que foi o segundo país a ratificá-la depois do Níger.
O que acontece depois? Como garantir que não seja simplesmente uma assinatura em um pedaço de papel?
A assinatura simboliza um compromisso real. Ao ratificar o Protocolo, os países se comprometem a aplicá-lo, ou seja, tomar as medidas necessárias para cumprir as obrigações estabelecidas no documento.
Para garantir isso, a OIT possui um sistema de supervisão sofisticado que verifica se os governos adotaram, de fato, as medidas necessárias. O sistema se baseia na análise periódica dos relatórios fornecidos pelos países, comentando a sua ação e levantando questões, quando necessário. Os resultados dessa supervisão são públicos, o que significa que qualquer pessoa, seja jornalista, ONG ou cidadão, pode ver como um país está cumprindo suas obrigações.
Estou um pouco confuso. Estamos falando de trabalho forçado, tráfico ou escravidão moderna?
Os termos às vezes são vagamente utilizados para dar conta de situações que se sobrepõe.
A OIT vem lutando contra o trabalho forçado desde a adoção de uma Convenção em 1930, quase universalmente ratificada. A Convenção define o trabalho forçado como todo trabalho que é contraído sob a ameaça de qualquer penalidade e pelo qual essa pessoa, o trabalhador, não ofereceu a si mesmo voluntariamente. Sempre que esses três elementos estão presentes (o trabalho, a ausência de consentimento e a presença de uma ameaça) pode-se dizer que ali existe o trabalho forçado.
O tráfico de pessoas foi definido em 2000, pelo Protocolo de Palermo, como o recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou acolhimento de pessoas, através do uso da força, coerção, fraude ou outros meios, para fins de exploração.
Finalmente, a escravidão moderna é um conceito que não tem uma definição legal internacional, mas que é frequentemente usado para descrever situações de extrema exploração.
Como o Protocolo ajudará a combater o trabalho forçado?
O Protocolo dará um novo impulso à ação de combate ao trabalho forçado, exigindo que os países adotem medidas adicionais para a prevenção, proteção e assistência às vítimas, além de permitir que elas tenham acesso à justiça e à compensação.
Tudo isso deve ser feito de forma coordenada no âmbito de um plano ou política nacional, em consulta com as organizações de empregadores e de trabalhadores.
Finalmente, o sistema de supervisão que mencionamos anteriormente significa que é possível garantir que o compromisso assumido por esses países seja efetivamente colocado em prática.
Na sua opinião, quais são os principais obstáculos à erradicação do trabalho forçado?
A primeira dificuldade é detectar situações de trabalho forçado, além de identificar e assistir às vítimas, que normalmente se encontram em situação de grande vulnerabilidade. Elas não são capazes de se defender, e às vezes nem mesmo de procurar ajuda.
Posteriormente, há a questão da impunidade. Na prática, o número de condenações é baixo em comparação com o número de vítimas. No entanto, punir os responsáveis com prisão, multas elevadas ou o confisco de seus bens desempenha um importante papel dissuasivo, particularmente porque sabemos que os lucros do trabalho forçado são de 150 bilhões de dólares por ano. A corrupção que existe em certos países também é um verdadeiro obstáculo.
Mas, se os países trabalharem juntos, é possível erradicar este mal.
E todo mundo tem um papel a desempenhar …
Então, não é apenas responsabilidade do Estado?
Sim e não. É decisão dos Estados de ratificar o Protocolo e eles são responsáveis por assegurar sua aplicação. Mas, muitos outros atores também estão envolvidos.
Em primeiro lugar, organizações de empregadores e de trabalhadores. Além de estarem estreitamente associados à implementação do Protocolo, elas participam do sistema de supervisão da OIT, por meio do qual podem fornecer informações sobre a forma como um país está cumprindo suas obrigações.
O Protocolo exige a devida vigilância dos empregadores públicos e privados para prevenir e responder aos riscos de trabalho forçado.
Os sindicatos e os serviços de fiscalização do trabalho têm também um papel fundamental na identificação das vítimas. No entanto, outras pessoas também podem ser confrontadas com trabalho forçado e, portanto, devem ser capazes de identificá-lo, incluindo policiais, advogados e juízes, assistentes sociais, jornalistas, cuidadores e ONGs.
Finalmente, a OIT apoia os governos, os empregadores e os trabalhadores, na prevenção e combate ao trabalho forçado em todas as suas formas. Por meio de inúmeros projetos em todo o mundo, a OIT conhece bem a realidade do trabalho forçado na prática e é capaz de implementar diferentes tipos de abordagens.
Somente trabalhando em conjunto é possível erradicar o trabalho forçado de uma vez por todas.
E o que podemos fazer como indivíduos?
A mudança depende muito de você!
Seja comprometido enquanto cidadão. Incentive o seu país a ratificar e aplicar o Protocolo. Seja um consumidor responsável e procure descobrir como os produtos que você usa são produzidos.
Preste atenção no que acontece lá fora cotidianamente e, veja o que se passa em torno de você, em sua vizinhança, em seu local de trabalho. Aprenda a identificar os sinais de trabalho forçado.
Filie-se a um sindicato ou torne-se membro de uma ONG.
Faça parte da campanha “50 for Freedom” e fale com amigos e conhecidos sobre isso.